A ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados) está criando regulação para transferências internacionais de dados pessoais. O documento será o primeiro passo para estruturar as chamadas transações cross-data, conceito de cruzamento de dados entre servidores e países diferentes, que pode melhorar a experiência do consumidor.
Na China, o modelo já foi observado com o superapp WeChat: um usuário pode fazer o cadastro e adicionar cartões na carteira digital do aplicativo e registrar seu perfil no Brasil. Ao chegar na China seria possível usar os mesmos dados e o mesmo app para fazer pagamentos, sem fricção.
Quem conta a experiência é Airton Melo, diretor de vendas da Huawei, na Futurecom, evento do setor de telecom.
“Tinha, em 2019, uma conta no WeChat que fiz no Brasil e conseguia fazer tudo por ela, não precisava de cartão ou dinheiro. Meus dados foram reconhecidos no sistema do app na China. Porém, quando retornei em 2020, fui usar novamente o app e não consegui. Uma nova regulamentação local não permitia mais esse cross-data e tive que baixar o app novamente, adicionar um novo cartão e fazer novo perfil para usar o app e fazer compras lá”, conta.
Segundo Melo, a tecnologia para o cross-data já existe, mas é preciso regular esse tipo de circulação da informação para acompanhar a jornada do cliente em diferentes lugares. “Ao regular os dados, é possível garantir uma experiência fluida. Como o WeChat, por exemplo, já faz: integra o passaporte em seu sistema e, no aeroporto, o consumidor só precisa passar em um reconhecimento facial, sem mostrar nenhum documento”, diz.
João Del Nero, gerente da Embratel, do grupo Claro, acrescenta que a companhia já trabalha com cross-data interno utilizando as informações que possui para retirar novos insights.
“Trabalhamos em silos na Claro e já conectamos tudo o que é possível e faz sentido respeitando as regras de dados atuais. Pensando em casos de uso, uma operadora poderia ser até um meio de pagamento, sendo o canal principal do cliente, e para isso precisa ser também cross-data. Ainda temos desafios para um ‘Open telecom’ acontecer, mas para prover a melhor experiência precisamos cruzar dados”, avalia o executivo.
João Pedro Tonini, diretor de produtos do Mercado Pago, também vê relacão entre o cross-data e as transferências financeiras.
“É possível que um vendedor na China tivesse acesso aos dados do pagador daqui e pudesse fazer ofertas personalizadas. Ainda não é possível, mas é um caso de uso. Outro exemplo, mas no âmbito financeiro, é o próprio pagamento com Pix em Buenos Aires. Alguns vendedores já se adaptaram e estão fazendo as transações cross-boarder (entre países) vendendo com Pix através de parceiros”, avalia.
Na visão de Tonini será preciso regular esses formatos de circulação de dados e do dinheiro para que seja possível ampliar o uso do Pix e novos serviços e produtos.
“O BC possibilitou, desde julho, que as instituições de pagamento façam transações de câmbio. Mas a transação cross-boarder de pagamentos tem questões a serem melhoradas, como a velocidade e a segurança. Mas estamos avançando no tema. Nos próximos anos vamos ver novas evoluções. É um nicho que ainda precisa evoluir bastante e pode ser totalmente integralizado”, afirma Fernanda Garibaldi, diretora-executiva da Zetta, associação que representa fintechs como Nubank e Mercado Pago.
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