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Governo precisará cortar despesas mesmo se mudar meta fiscal para déficit de 0,5% do PIB em 2024, dizem economistas

Foto de stock de Nesta ilustração fotográfica sendo exibida notas de cento e duzentos reais e uma moeda de um real destacada. O Real é o dinheiro atual no Brasil

Alvo de especulações e disputa dentro do próprio governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a possível mudança da meta fiscal de 2024 de um equilíbrio das contas públicas para um déficit de até 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) pode não garantir a execução de todas as despesas planejadas pelo Palácio do Planalto na peça orçamentária.

É o que avaliam os economistas da corretora Warren Rena. Em relatório recente distribuído a clientes, a casa reforçou projeção de déficit de 0,74% do PIB no ano que vem – o que estaria dentro da banda de tolerância de 0,25 ponto percentual permitido pelo novo marco fiscal. O número seria resultado da diferença entre receitas líquidas de 18,24% e despesas primárias de 18,98%, ambas em relação ao PIB.

Mas tal cenário pressupõe um “contingenciamento importante” de despesas discricionárias – ou seja, aquelas que em tese o Poder Executivo tem maior margem de manobra para alocação (o que nem sempre se verifica na prática), conforme aponta o texto assinado por Felipe Salto, economista-chefe, e Josué Pellegrini, analista de macroeconomia.

“Projetamos que essas despesas (discricionárias) ficarão em R$ 172,3 bilhões, enquanto no PLOA 2024, estão orçadas em R$ 211,9 bilhões, incluindo-se a reserva de contingência de R$ 37,6 bilhões, que deve ser alocada nas emendas parlamentares durante a tramitação do projeto. Assim, de acordo com nossas projeções, o estabelecimento da meta em déficit de 0,5% do PIB não criaria espaço fiscal para gastar o que está previsto no PLOA 2024 como despesa discricionária”, afirmam.

Vale lembrar que o arcabouço fiscal permite que metas fiscais não sejam cumpridas, mas prevê o acionamento de gatilhos definidos na própria Constituição Federal caso isso aconteça. Além disso, o texto livra o agente público de eventuais punições, desde que ele tenha adotado as medidas de limitação de empenho e pagamento, preservado o nível mínimo de despesas discricionárias necessárias ao funcionamento regular da administração pública e não tenha ordenado ou autorizado medida em desacordo com vedações previstas na legislação.

Na prática, tal regra torna necessária a realização de contingenciamentos quando percebido distanciamento entre o comportamento de receitas e despesas durante a execução orçamentária em comparação com o previsto na peça aprovada pelo Congresso Nacional. Pela lei complementar que instituiu o novo marco fiscal, o nível mínimo de despesas discricionárias é de 75% do valor autorizado na respectiva lei orçamentária anual – o que indicaria um teto de R$ 53 bilhões, considerando os números hoje em discussão.

“Se as discricionárias do PLOA 2024 fossem executadas integralmente e as despesas obrigatórias adequadamente orçadas, as despesas primárias ficariam em 19,2% do PIB. Se, ademais, a receita líquida esperada no PLOA, de 19,2% do PIB, também se mostrasse correta, a preservação total das despesas discricionárias seria compatível com a meta fiscal zero. Entretanto, é pouco provável que se consiga esse tamanho de receitas. Um percentual de 18,2% do PIB parece ser mais realista, e, nesse caso, estaríamos falando de déficit de 1% do PIB em 2024”, ponderam os economistas da Warren.

No texto, eles também destacam as possíveis consequências para uma alteração da meta fiscal logo no primeiro ano de vigência do arcabouço fiscal. Para Salto e Pellegrini, o movimento, se confirmado, afetará a credibilidade do novo regime e tornaria menos crível as metas indicativas para os anos de 2025 (superávit de 0,5% do PIB) e de 2026 (superávit de 1% do PIB). De todo modo, a dupla considera ainda mais significativo o efeito de fala de Lula rechaçando qualquer possibilidade de corte de despesas no Orçamento de 2024.

No início do mês, em mais uma sinalização de que não deve promover ajuste fiscal, Lula disse que o governo não pode deixar sobrar dinheiro destinado a investimentos. “Para quem está na Fazenda, dinheiro bom é o dinheiro do Tesouro. Mas para quem está na presidência, dinheiro bom é dinheiro em obras, em estradas, em escolas”, disse.

Para os economistas da Warren Rena, caso o governo entregue um déficit de 1% no ano que vem, seria muito difícil realizar os movimentos necessários para cumprir a meta de um superávit de 0,5% do PIB no exercício seguinte – uma reversão de 1,5 ponto percentual, incomum na série histórica do Tesouro Nacional.

“Supondo-se que essa piora de um ponto percentual do PIB se estenda às metas indicativas de 2025 e 2026, projetamos piora de 3 pontos percentuais de PIB, na DBGG [Dívida Bruta do Governo Geral], frente ao cenário de cumprimento das metas do PLOA 2024″, afirmam.

A nota técnica encaminhada a clientes também mostrou três cenários para a trajetória da DBGG entre 2023 e 2026. No primeiro deles, são levadas em consideração as metas fiscais definidas no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias: 0% em 2024, +0,5% em 2025 e +1% em 2026.

No segundo cenário, em que as projeções são ajustadas por uma piora de 1 p.p. no resultado primário do ano que vem em relação ao PIB, os economistas trabalham com déficit de 0,5% em 2025 e equilíbrio em 2026. Já no cenário base, realizado a partir de projeções da corretora, o resultado primário alcança média de déficit de 0,75% do PIB entre 2024 e 2026.

“No Cenário 1, no qual as metas estabelecidas no PLOA 2024 fossem alcançadas, a trajetória da DBGG esboçaria uma tendência para o limite de cerca de 78% do PIB, no atual mandato presidencial. Já no cenário base e no Cenário 2, a trajetória seria relativamente parecida, com dívida ascendente e que chegaria a 81,5% e a 80,7% do PIB, respectivamente, em 2026”, pontuam os economistas.

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