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A divisão 60/40 ainda é a melhor para montar sua carteira de investimentos? 

Não é preciso entender de economia para conhecer a frase “não existe almoço grátis”, amplamente usada por quem fala de dinheiro e investimentos. No entanto, um vencedor do Prêmio Nobel de Economia já desafiou o dito popular ao afirmar que a diversificação é o único almoço grátis no universo dos investimentos. 

Na década de 1950, quando a seleção de ativos ainda era amadora, Harry Markowitz criou a Teoria Moderna do Portfólio e revolucionou a maneira de planejar os investimentos. Sua obra influenciou o mercado global e gerou a divisão 60/40 (60% em ações e 40% em renda fixa), famosa até hoje. 

No entanto, o mundo mudou após a pandemia de Covid-19: países desenvolvidos agora convivem com taxas de juros mais altas e inflação persistente. A correlação entre renda fixa e ações mudou e a divisão 60/40 teve seu pior desempenho na história em 2022. O InfoMoney conversou com três especialistas em alocação para entender se o jeito de pensar na carteira idealizado por Markowitz ainda é válido hoje em dia.

O que Markowitz pensava sobre investimentos

A Teoria Moderna do Portfólio (TMP) se propõe a ajudar investidores a potencializar ganhos enquanto reduzem riscos. Esse conceito só parece óbvio para alguns investidores atualmente por causa do economista norte-americano. Para ele, a verdadeira diversificação não está em comprar vários ativos aleatoriamente, mas em escolher instrumentos que se comportam de maneiras diferentes. 

Markowitz provou que o risco de uma carteira depende de como os ativos se relacionam entre si, não apenas no risco individual que cada um carrega. 

O economista também é responsável pelo conceito de fronteira eficiente – quando o portfólio tem o máximo retorno esperado para um determinado nível de risco. A linha amarela do gráfico abaixo representa a fronteira eficiente, que pode ser atingida observando a correlação entre ativos de baixo e alto risco e dosando a posição em cada um para encontrar a alocação mais eficiente.

Fontes: XP, Nasdaq

Para entender a TMP ainda é importante saber que ela usa o desvio-padrão como principal métrica de risco: quanto mais um ativo se desvia de sua média histórica, maior a volatilidade e, portanto, maiores são os riscos e o retorno esperado. 

A Teoria de Markowitz morreu? 

Com a correlação entre os ativos como ponto central, a Teoria teve na pandemia de Covid-19 uma de suas principais provas. Afinal, os choques causados pelos lockdowns afetou a relação entre renda fixa e renda variável. Com inflação e juros mais altos, a renda fixa passou a ser uma opção rentável mesmo enquanto as Bolsas vão bem.

Um estudo da gigante de investimentos americana KKR divulgado em julho deste ano mostrou que uma carteira com peso de 60% em ações do S&P 500 e 40% em títulos do governo americano estaria no vermelho entre janeiro de 2022 e abril de 2025, com retorno chegando a -24% em outubro de 2022 e -5% em abril deste ano. 

O relatório mostra que, pela primeira vez em 150 anos, a renda fixa não se comportou como a proteção na qual os investidores podem confiar enquanto as ações vão mal.

No entanto, “ainda é cedo para tirar conclusões (sobre a morte da TMP)”, segundo Rodrigo Sgavioli, Head de Alocação do Research da XP Investimentos. Ele ressalta que a Teoria foi usada majoritariamente em tempos de juros baixos e inflação controlada; por isso, é necessário cautela para avaliar seu desempenho no novo cenário. 

O especialista conta que a XP não usa apenas a TMP como base teórica para a construção de portfólios. O modelo Black-Litterman, que permite a incorporação de crenças individuais sobre o mercado para diminuir a dependência de dados históricos, também é usado na casa, assim como a recém-incorporada estratégia de Paridade de Risco, que prevê cada classe de ativos contribuindo com uma parcela igual de risco para o portfólio. 

Harry Max Markowitz (crédito: Divulgação)

Para Gustavo Harada, head de alocação da Blackbird Investimentos, a Teoria Moderna do Portfólio continua relevante, mesmo com o aumento da complexidade dos mercados: “hoje, mais do nunca, a diversificação não está apenas na quantidade de ativos, mas na qualidade”. 

A divisão 60/40 ainda funciona?

Harada diz que o modelo “é um ponto de partida, não uma solução universal”. Ele ressalta que “em alguns momentos recentes, ações e títulos de renda fixa caíram ao mesmo tempo, o que compromete o efeito do 60/40 clássico; então, hoje, portfólios mais dinâmicos, que se ajustam à conjuntura macro e aos ciclos de juros fazem mais sentido”. 

Na Tivio, a métrica de retorno esperado para os próximos anos se sobrepõe no momento de escolher os ativos. Rafael Espinoso, estrategista da gestora, diz que “ao que parece, o retorno esperado será menor tanto para renda variável quanto para a renda fixa olhando para os Estados Unidos e se faz necessário incorporar classes que poderão gerar retornos maiores ajustados ao risco”. 

Aí entram os investimentos alternativos: ativos como ouro e instrumentos ligados à infraestrutura. Eles vêm sendo incorporados aos portfólios para buscar descorrelação e aumentar a proteção contra a inflação, maior vilã dos retornos nos últimos anos. 

“Temos olhado para alocações mais ligadas a ativos reais e setores da economia que representam maiores ganhos acima da inflação, como infraestrutura, principalmente lá fora”, conta Sgavioli. “É preciso ter mais ativos que te protejam da inflação e que te tirem das correlações tradicionais”. 

Ou seja, mesmo em um mundo mais desenvolvido, com ativos que não existiam quando Markowitz criou sua Teoria, é possível usar suas ideias para incorporar ativos como FIDCs (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios), debêntures, criptomoedas e ouro aos portfólios. 

Espinoso ensina que é preciso testar pesos nos portfólios para encontrar o ponto de equilíbrio entre risco e retorno. Para os profissionais, é importante se atentar ao que o cliente busca e fazer os ajustes necessários em momentos de euforia ou estresse, pontua o especialista. 

A Teoria Moderna do Portfólio “foi criada para qualquer conjunto de ativos que a gente consiga medir expectativa de retorno, volatilidade e correlação”, lembra Harada. “Então, se uma classe oferece retorno adicional e um comportamento descorrelacionado, ela pode, sim, melhorar a fronteira eficiente”. 

Portanto, as ideias de Markowitz seguem atuais, mas é necessário se adaptar às mudanças no cenário macroeconômico, assim como os especialistas em alocação vêm fazendo. “Nossa abordagem não é a maximização de retorno, mas sim a otimização do retorno ajustado ao risco”, diz Sgavioli. Se investir é um jogo infinito, você não pode morrer no meio do caminho”, lembra o executivo. 

Ao ser perguntado sobre como Harry Markowitz avaliaria a relevância da TMP atualmente, o head de alocação da XP diz que ele provavelmente entenderia que o mundo passa por uma transformação importante e “talvez não haveria ninguém melhor do que ele para discutir academicamente essas adaptações (à TMP) que vários de nós aqui estamos tentando correr atrás”. 

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