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IA, fake news e eleições: o que o TSE mudou na propaganda eleitoral

A eleição presidencial de 2026 promete ser diferente de todas as anteriores, não apenas pelo cenário político, mas também pelo nível de vigilância sobre o que circula na internet. No dia 4 de outubro, mais de 155 milhões de brasileiros escolherão seus representantes sob regras mais rigorosas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que decidiu apertar o cerco contra fake news, manipulações digitais e o uso descontrolado da inteligência artificial nas campanhas.

As novas diretrizes surgiram ainda nas eleições municipais de 2024 e agora passam a valer como padrão para o pleito nacional. Na prática, elas mudam a forma de fazer campanha em um país onde redes sociais, vídeos curtos e conteúdos altamente emocionais se tornaram tão ou mais relevantes do que o tradicional horário eleitoral na televisão.

O que muda nas campanhas

O ponto que mais chama atenção é a proibição explícita dos chamados deepfakes — vídeos, áudios ou imagens criados por inteligência artificial para simular falas e situações que nunca existiram. A Justiça Eleitoral considera esse tipo de material uma ameaça direta à lisura da disputa e ao direito de escolha do eleitor.

Quem recorrer a esse tipo de ferramenta pode sofrer punições severas, que vão desde a cassação do registro ou do mandato até a responsabilização com base na legislação eleitoral. Além disso, qualquer uso de inteligência artificial em peças de campanha deverá ser informado de forma clara ao público.

A resolução também fecha o cerco contra robôs e sistemas automatizados usados para simular conversas com eleitores. Essa prática se tornou comum em aplicativos de mensagens e redes sociais para inflar o engajamento e criar a sensação de proximidade artificial. Para o TSE, esse tipo de estratégia distorce o debate e desequilibra a disputa.

Por que o TSE apertou as regras

O endurecimento das normas reflete a própria evolução da desinformação no Brasil. Em 2018, boatos e notícias falsas se espalharam sobretudo em grupos de mensagens. Em 2022, o fenômeno ganhou novas camadas, com atuação em várias plataformas e o uso crescente de ferramentas de inteligência artificial, o que dificultou separar conteúdo verdadeiro de material manipulado.

Organizações internacionais, como a Unesco, vêm alertando para o papel de influenciadores políticos que misturam entretenimento, opinião e informação distorcida. Esses perfis alcançam grandes audiências e operam com baixo grau de responsabilização, muitas vezes ocupando um espaço semelhante ao da imprensa, mas sem compromisso com checagem ou apuração.

Nas últimas semanas, a circulação de vídeos hiper-realistas produzidos com inteligência artificial voltou a acender o alerta na Justiça Eleitoral. Técnicos do tribunal avaliam que a combinação entre ferramentas cada vez mais acessíveis e a lógica de viralização das plataformas pode criar um ambiente de forte instabilidade informacional durante a campanha de 2026.

Pressão sobre plataformas e big techs

Diante desse cenário, a presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, criou um grupo de trabalho com especialistas para atualizar regras e reforçar os instrumentos de controle. Um dos focos é fortalecer o Sistema de Alertas de Desinformação Eleitoral, que busca agilizar a comunicação entre o tribunal e as plataformas digitais para a retirada de conteúdos fraudulentos.

As decisões recentes ampliam de forma significativa a responsabilidade das empresas de tecnologia durante o período eleitoral. A resolução prevê responsabilização solidária das plataformas que não retirarem rapidamente conteúdos ilegais, como desinformação, discurso de ódio, apologia ao nazismo ou mensagens antidemocráticas.

O texto também proíbe a circulação de conteúdos fabricados ou manipulados para distorcer fatos de forma grave quando houver risco ao equilíbrio da eleição. Caso não haja ação imediata das plataformas, a Justiça Eleitoral poderá impor sanções e até determinar a divulgação de informações corretivas ao eleitor.

Como os eleitores consomem política

As novas regras surgem em meio a uma mudança estrutural no consumo de informação política. Pesquisa do DataSenado, de 2024, indica que 72% dos eleitores se informam sobre política pelas redes sociais, enquanto apenas 18% citam televisão ou rádio como principal fonte.

Esse deslocamento alterou profundamente a lógica das campanhas. O tempo de TV perdeu centralidade e o engajamento digital passou a ser decisivo. O eleitor deixou de ser apenas receptor e passou a atuar como multiplicador e, em muitos casos, criador de mensagens políticas.

Nas eleições municipais de 2024, esse movimento ficou evidente. Cerca de 81% dos mais de 460 mil candidatos declararam possuir perfis em redes sociais, segundo dados do TSE. Instagram e Facebook concentraram a maioria dessas contas, enquanto plataformas como TikTok ampliaram sua presença.

Impactos sociais e o desafio de 2026

Além da integridade do processo eleitoral, o tribunal tem destacado os efeitos sociais da desinformação. Cármen Lúcia demonstrou preocupação especial com o uso da inteligência artificial na disseminação de ataques contra mulheres na política.

Segundo a ministra, prefeitas com altos índices de aprovação desistiram da reeleição após campanhas de desmoralização digital amplificadas por algoritmos.

Ao mesmo tempo, o grupo de trabalho do TSE discute usos positivos da inteligência artificial, como apoio à identificação de conteúdos falsos, fortalecimento de sistemas de checagem e ampliação do letramento digital do eleitor.

O conjunto de medidas aponta para um novo padrão de campanha em 2026, marcado por mais vigilância, maior transparência e responsabilização ampliada de candidatos, partidos e plataformas.

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